A maioria das crianças entre três e cinco anos cria um amigo imaginário. O amigo imaginário ou invisível, como é popularmente conhecido, funciona como uma espécie de recurso para os pequenos compreenderem e elaborarem todos os sentimentos de alegria e tristeza que despertam nessa idade.
Quem nunca se deu conta de falar sozinho, discutir determinados assuntos consigo mesmo ou agir como se houvesse uma outra pessoa presente ao seu lado? Com certeza uma grande parte da população já viveu uma situação semelhante a essa. Se isso muitas vezes acontece na fase adulta, saiba que também pode ocorrer na infância. Nesse caso, há uma explicação de fundo psicológico e emocional. De acordo com a psicóloga Gláucia Guerra Benute, da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo, três em cada dez crianças entre três e cinco anos criam um amigo imaginário ou invisível. Ele pode surgir de dois modos: amigo invisível ou objetos personificados como travesseiro, cobertor, fralda, chupeta, entre outros (com os quais as crianças interagem dando-lhes vida, como se fossem de verdade). Além de fazer parte das atividades de rotina da criança, com ele os pequenos costumam brincar, conversar e discutir determinadas situações ou até mesmo brigar quando se sentem contrariadas. Mas, na maioria das vezes, buscam dividir suas alegrias e principalmente suas tristezas. “É muito comum e extremamente saudável as crianças criarem um amigo imaginário durante a infância. Esta é a forma que elas encontram de se comunicarem com elas mesmas”, explica a psicóloga.
Embora as crianças tenham consciência de que o amigo invisível não passa de uma invenção de sua própria imaginação, usam disso como um recurso valioso para seu desenvolvimento e para compreender e elaborar todos os sentimentos que estão envolvidos em determinadas situações, principalmente os mais conflituosos como o medo, a frustração, a angústia, a raiva e a preocupação.
Na maioria dos casos, essa reação pode ser desencadeada por mudanças de hábitos ou situações de estresse e ansiedade, que acabam transformando a rotina da criança. Em geral, podem se manifestar com o nascimento de um irmãozinho, a separação dos pais, a perda de alguém na família ou outras pessoas queridas, a mudança de um professor ou de endereço, entre outros motivos. “De certa forma, todos esses acontecimentos podem gerar angústia e expectativa na criança. Em relação aos exemplos acima, elas temem não serem aceitas ou não saberem lidar com as novas circunstâncias”, afirma.
Para a profissional, os “amigos especiais” servem também para dar mais segurança à criança e para que ela perceba o seu potencial em conseguir controlar determinadas situações que fazem parte do crescimento, de maneira mais fácil e menos dolorida. Além disso, o faz-de-conta permite a ela se sentir dona da situação, pois é nesses momentos que tem a oportunidade de exercer a vontade própria, a autoridade, compartilhar segredos e até mesmo dar ordens, o que não seria possível com os amigos reais, irmãos e até mesmo com adultos.
O que os pais devem fazer?
Em primeiro lugar, os pais não devem se apavorar, porque esta é uma atitude totalmente normal da criança. Em segundo lugar, os pais não devem interferir. De acordo com a psicóloga, quando o filho (a) estiver falando com o amigo imaginário e agindo como se ele fosse de carne e osso, brincando com ele, chamando para jantar e sentar ao seu lado, os pais devem apenas observar e ouvir o que dizem e ficar atentos aos seus gestos e atitudes. Nunca devem incentivá-los ou reforçar a presença “dele”. “No caso dos adultos se comportarem como se o ‘amiguinho’ realmente exista, isso poderá deixar a criança totalmente confusa, uma vez que ela sabe que isso não passa de uma brincadeirinha inventada por ela. Já em uma atitude contrária, como a repreensão, a criança pode se sentir desrespeitada e confrontada, pois sentirá que os pais estão tirando dela um recurso que criou para se auto-defender. Os pais devem participar da conversa apenas quando forem solicitados”, recomenda Gláucia.
Atenção a determinadas atitudes.
O que os pais devem perceber é o grau de interferência que esse tipo de recurso pode ter na vida da criança, pois a função do amigo imaginário não deve ser, em momento algum, prejudicial ao seu desenvolvimento. Existem algumas atitudes que a criança pode manifestar e que merecem uma atenção maior dos adultos. Entre elas os pais devem observar:
- A influência que o amigo imaginário tem na vida da criança, no caso dos filhos incluírem este personagem em todas as brincadeiras e atividades do dia-a-dia;
- Se a criança tem dificuldade de conviver e se sociabilizar com outras crianças;
- Se prefere a companhia do amigo de mentirinha aos de verdade ou à própria família;
- Quando a criança passar horas isolada, brincando sozinha, mesmo quando está em grupo.
Na maioria dos casos, essas manifestações são dissipadas com o tempo. O mais comum é a criança recorrer ao amigo imaginário com uma freqüência ainda menor conforme for ficando mais velha, até eliminá-lo de vez. Isso deve começar a acontecer por volta dos quatro anos e pode se estender, no máximo, até os cinco anos e meio de idade. Ao persistirem nessas fantasias ou fugirem de situações consideradas normais e aceitáveis durante um determinado período, os pais devem procurar ajuda especializada, como psicólogos.
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